MOVIMENTO EM SALVADOR
"Agora, só Deus", diz idosa sobre fim da ocupação em hotel em Patamares
Grupo deve deixar o antigo Hotel Sol Bahia Atlântico nesta quinta-feira, 12
Por Andrêzza Moura

A tarde desta quarta-feira, 11, na ocupação do Movimento Social de Luta por Moradia e Cidadania da Bahia (MSMC), nas ruínas do antigo Hotel Sol Bahia Atlântico, na Rua Manoel Antônio Galvão, no bairro Patamares, em Salvador, foi para ajustar e definir as diretrizes para a desmobilização dos integrantes, marcada para a manhã desta quinta-feira, 12.

Para o diretor do movimento, Carlos Alberto Araújo dos Santos, o grupo deixa o imóvel com um saldo positivo. Ele esclarece que, apesar do recuo na decisão de continuar com a ocupação, não significa que a 'luta' esteja perdida. O grupo, com cerca de 600 famílias, está ocupando o espaço desde o dia 31 de maio.
"Estamos dando dois os atrás, para avançar quatro. Nós vamos sair de forma ordenada, civilizados, sem que ninguém toque no fio de cabelo de vocês. Porque o maior objetivo, que eu acredito, não é morar em um prédio que não tem estrutura digna para que vocês possam dizer: 'minha casa'".

Ainda segundo o diretor, durante os 12 dias de mobilização, aconteceram várias tratativas e, Carlos Alberto reitera que a decisão de deixar o empreendimento abandonado parte da imposição da Justiça e da aplicação de uma multa diária. "Nós procuramos de todas as formas dialogar com o governo, alinhar com o nosso jurídico para tentar derrubar [liminar]. E nós entramos com quatro recursos, todos eles, nós perdemos. Eles [advogados dos donos do imóvel] entraram com agravo e o juiz determinou a desocupação ou teremos que pagar uma multa de 50 mil reais, dia. Então, no meu entendimento, não é bom que a gente aposte na sorte", declarou o representante do MSMC.
Despedida e lamento

A vendedora Raimunda Santos da Silva, 63 anos, é uma das pessoas que terá de sair do imóvel, na manhã desta quinta-feira. Abalada com a notícia, ela estava preocupada com os demais companheiros que não terão para onde retornar.
"Minha filha, a gente tem que aceitar, né? Eu ainda tenho para onde voltar. Moro próximo a um brejo, em uma área de risco. Quando chove, a água chega no meio da parede. Mas, graças a Deus, tenho para onde ir. E quem não tem? Muita gente não pode mais pagar aluguel, nem tem para voltar", lamentou a idosa, que mora no Alto do Coqueirinho, em Itapuã.
Uma das pessoas que está sem saber o que fazer depois de deixar o acampamento é dona Sandra Vicente, 66. Pessoa cega e moradora do Jardim das Margaridas, ela lembra que, antes de chegar ao prédio, vivia de favor na casa de um conhecido.
![[ao fundo] Dona Sandra, que é cega, não sabe para onde ir quando deixar a ocupação](https://cdn.atarde-br.noticiasdopara.net/img/inline/1330000/724x0/Agora-so-Deus-diz-idosa-sobre-fim-da-ocupacao-em-h0133060603202506112243-1.webp?fallback=https%3A%2F%2Fcdn.atarde-br.noticiasdopara.net%2Fimg%2Finline%2F1330000%2FAgora-so-Deus-diz-idosa-sobre-fim-da-ocupacao-em-h0133060603202506112243.jpg%3Fxid%3D6689246&xid=6689246)
"Agora, só Deus. Nós temos que nos preparar para procurar a pessoa que eu estava [morando] ou procurar algum lugar para ficar. No momento, não tenho para onde voltar. Tem que ser assim, né? Nós temos que ser realistas e continuar a luta. Eu, particularmente, estou sozinha. Aqui, nós temos alimentação, nós estamos vivendo um ajudando o outro, virou uma comunidade. Nós entramos com esperança e estamos saindo com esperança que tudo vai melhorar, que tudo vai acontecer da melhor forma possível porque nós somos fiéis", disse a idosa, acreditando em um futuro melhor.
Logo após a reunião, encontramos a dona de casa Patrícia Sousa Santos, 41. Com os olhos marejados, ela seguia para o quarto, onde está morando há dez dias com o esposo e a filha caçula, de 4 anos, para a arrumar os pertences da família.
No último dia 2 de junho, Patrícia já havia conversado com o Portal A TARDE e, diferente desta quarta-feira, falou sobre a esperança de conseguir uma casa melhor para criar a pequena Hadassah. Elas moram no Bairro da Paz.

Assim como dona Raimunda, a dona de casa também demonstrou preocupação com os demais integrantes do movimento. "Hoje, estou triste, muito triste. Por saber que eu vou e por, petititico ou não, eu tenho um lugar para morar. Triste por aqueles que não têm [casa] e estão na rua, muitos morando de favor, outros estavam morando de aluguel e não tem mais dinheiro para pagar", lembrou.

"Enquanto estávamos aqui unidos, um ajudava o outro, um acolhia o outro. Mas, saber que nos todos vamos voltar para nossa realidade é muito triste. A realidade de não ter ajuda, a realidade de precisar, e muitos ter para ajudar e não ajudar. A realidade de saber que onde você mora não pode colocar a cara para fora porque é tiro para tudo que é lado. Só de saber disso, é muita tristeza", finalizou a mulher.
Acolhimento provisório
Questionado para onde serão encaminhadas as pessoas que não têm para onde ir, o diretor Carlos Alberto revelou que busca apoio com o governo do estado.
"Bom, eu tenho perguntado ao governo o que a gente vai fazer com esse pessoal. Nas duas, uma. Ou elas voltam para onde estavam ou, de imediato, a única coisa que eu vejo e enxergo é sai dessa ocupação [hotel] e nós vamos fazer outras ocupações. Eu, particularmente, vou lutar para acolher essas mulheres, para dar a segurança e a estabilidade de moradia, mesmo que provisoriamente, para não deixar essas mulheres na rua", assegurou Santos.

Segundo ele, na próxima semana, representantes do Movimento Social de Luta por Moradia e Cidadania da Bahia se reunirão com a secretária Estadual de Desenvolvimento Urbano (Sedur), Jusmari Oliveira, para alinhar os próximos os.
Secretaria de Desenvolvimento Urbano
Procurado pelo Portal A TARDE, o órgão do governo se pronunciou por meio de nota encaminhada pela a assessoria de comunicação.
"Sobre o assunto mencionado, a Secretaria de Desenvolvimento Urbano (Sedur) acompanha com atenção as demandas habitacionais no estado e mantém diálogo constante com os órgãos competentes e movimentos sociais. No momento, ainda não há definição oficial sobre a destinação de unidades habitacionais para esse caso específico.

Qualquer informação concreta será comunicada de forma institucional e no tempo adequado. A secretária Jusmari reforça: 'estamos sempre atentos às necessidades da população e dialogando com os setores envolvidos para buscar soluções dentro das possibilidades do governo”.
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